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Em letras garrafais: 'FIM'
Beatriz Maineti

Apaixonada pelo futebol, mas, antes de tudo, feita de Corinthians. O mundo em preto e branco é mais bonito.

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Em letras garrafais, 'FIM'

Coluna da Beatriz Maineti

Opinião de Beatriz Maineti

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Em letras garrafais, FIM

Paulinho marcou de cabeça o gol que garantiu o Corinthians na semifinal da Libertadores em 2012

Foto: Daniel Augusto Jr/Ag. Corinthians

Eu tinha 14 anos quando o 2012 do Corinthians aconteceu. No auge da adolescência, mas ainda muito longe de vivê-la inteiramente, minhas maiores preocupações na época eram com o último ano do Ensino Fundamental e com a ida para uma nova escola no Ensino Médio. Me preocupava com o cabelo, que estava sofrendo muito com a puberdade, e também com o formato dos óculos que não me favoreciam em nada. Ficava me perguntando se lentes de contato seriam a solução.

Mas existia um outro aspecto para aquela Beatriz de 14 anos. Numa casa onde se respira Corinthians 24 horas por dias, aquele ano foi vivido com uma intensidade surreal. As minhas preocupações pessoais ficavam de lado quando chegava o dia do jogo do Timão. O mesmo acontecia com meu pai e me irmão, que já acordavam tensos nas partidas mais decisivas. Aliás, duvido que qualquer um de nós realmente conseguia dormir na véspera de qualquer uma delas.

Naquela mesma casa, um sobrado grande que meus pais construíram para criar os três filhos, tudo existia de um jeito diferente em dia de jogo do Corinthians. A bandeira do clube tinha que ficar em cima da minha cama, lá no segundo andar. Meu irmão tinha uma roupa específica para usar. Eu colocava uma camisa velha e surrada do goleiro Felipe (lembra dele?) e sentava no canto direito do sofá. Meu pai ficava sentado sozinho no outro, que ficava bem ao lado e tinha só dois lugares.

Depois que o jogo terminava, era cada um para um canto. Meu pai e eu pegávamos um copo d'água em silêncio enquanto meu irmão preparava leite com achocolatado. Meu pai nos dava boa noite e subia primeiro, mas ficava na porta esperando os filhos chegarem aos seus quartos. Ninguém soltava um pio. Já acomodados para dormir, quase dava para ouvir o suspiro de alívio. Sobre o jogo, a gente falava no dia seguinte.

E assim foi até a final. Depois disso, nos dois jogos do Mundial de Clubes, seguíamos a mesma simpatia. Dessa vez, porém, era diferente: meu pai e meu irmão trabalhavam, e eu, de férias da escola, ficava responsável por todas as simpatias. A bandeira, a camisa do Felipe... tudo. Fiz a minha parte. Na grande final, ambos ficaram em casa para assistir. Deu certo.

Mas 2012 passou para mim. Eu cresci. Hoje, já não moro mais no sobrado que foi lar daquelas conquistas, não tenho mais aquele sofá e, infelizmente, nem a camisa do Felipe. Eu parei de me preocupar com o cabelo que sofria pela puberdade, aceitei o desafio das lentes de contato e segui em frente. Meu pai e meu irmão fizeram o mesmo. Todos nós fizemos.

O Corinthians, não. Os anos passavam, mas a instituição Sport Club Corinthians Paulista parecia presa naquele looping eterno de 2012 que se reacendia com as conquistas do Campeonato Brasileiro em 2015 e 2017, da trinca de Paulistões, daquele vice amargo na Copa do Brasil de 2018. O Corinthians, enquanto entidade, viveu preso a um passado que implorava para se desprender do clube.

Mais por obrigação do que por vontade própria, 12 anos depois daquele ano mágico, as amarras se soltaram e o Corinthians precisará seguir em frente. A torcida pedia ídolos novos, conquistas novas, histórias novas, e a instituição seguia entregando 2012.

A saída de Paulinho, anunciada nesta segunda-feira, colocou um ponto final neste capítulo. É hora de seguir em frente e usar 2012 de espelho, não de muleta, para buscar coisas novas. O clube e a torcida merecem ídolos novos, conquistas novas, histórias novas, e chegou - finalmente! - a hora de entregar isso a ela.

Seguir em frente não significa esquecer de vez daquilo que foi vivido, mas sim entender que aquilo não volta mais. A saudade sempre existirá. Viverei a sensação de saudosismo todos os dias, principalmente quando chegar a hora de ver os meus filhos com as suas próprias simpatias para os futuros campeonatos do Corinthians. Mas aí, então, será um novo capítulo.

Que a gente aprenda a dizer adeus na hora certa, sem prolongar despedidas e acenos na janela do ônibus. O Corinthians adiou - e muito - esse momento. Agora, foi obrigado a tomar uma decisão que, se dependesse só dele, talvez fosse adiada mais uma vez.

Enfim, livro encerrado. Em letras garrafais aparece o "FIM" no pé da página. É hora de colocá-lo na estante, e olhar sempre que possível com a saudade e felicidade que esse momento merece, mas sem a necessidade de revivê-lo todos os dias.

Veja mais em: Libertadores da América e Paulinho.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

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Por Beatriz Maineti

Apaixonada pelo futebol, mas, antes de tudo, feita de Corinthians. O mundo em preto e branco é mais bonito.

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